Publicado em 10 de outubro de 2017
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O direito ao esquecimento é um direito reconhecido pelo Ordenamento Jurídico brasileiro, fulcrado no princípio da dignidade da pessoa humana, guia mor da Constituição Cidadã, e no resguardo oferecido pelo Código Civil aos direitos da personalidade (privacidade, recato, dentre outros). Tal direito pode ser caracterizado como a possibilidade de um indivíduo pleitear a não propalação pelos meios de comunicação de um fato ocorrido em sua vida, até mesmo pelo constrangimento e/ou pela reabertura de chagas emocionais que este caso possa trazer.
Vale lembrar que o direito ao esquecimento é reconhecido também em outros países, como os EUA (right to be let alone) e em alguns locais da Europa. A genealogia de tal direito remonta aos casos de desviantes que cometeram crimes ignóbeis e precisavam se ressocializar, conquanto os meios de comunicação retratassem suas transgressões pregressas mesmo após o cumprimento da pena, obstaculizando este dificultoso processo. Por isso, percebeu-se a premente necessidade de consubstanciar a proteção ao direito ao esquecimento.
No Brasil, o STJ julgou dois casos de suma importância relacionados a esse direito: a veiculação do ignominioso assassinato de Aída Curi e a exposição da cruenta chacina da Candelária. No caso de Aída, o pedido de indenização por danos morais feito pelos lesados indiretos devido à veiculação do ocorrido no programa Linha Direta foi denegado, já que, por se tratar de um caso de primacial importância e que causa grande comoção pública, é imprescindível a apresentação da imagem de Aída para retratar o que ocorreu. Já no segundo caso, o pedido de indenização foi aceito pelo STJ, já que o programa suprarreferenciado exibiu a imagem de um elemento absolto do crime pelo qual foi julgado, trazendo transtornos de magnitude exacerbada para o mesmo. Ademais, considerou-se despicienda a utilização da imagem deste indivíduo para retratar o caso em sua integralidade, justificando-se, assim, a decisão adotada.
Conquanto existam diatribes dirigidas ao direito ao esquecimento, como a pretensa supressão da liberdade de expressão/informação (elementos precípuos para a consumação de uma poliarquia, segundo Robert Dahl) e ao direito à memória, o direito supracitado continua sólido em nosso ordenamento jurídico, se caracterizando como apanágio da personalidade dos compatrícios brasileiros.
Ademais, vale citar que o direito à memória, um direito coletivo, suplanta o direito ao esquecimento nos casos de extrema relevância. Um exemplo alvo são os crimes perpetrados pelos regimes nazistas e comunistas, já que o primeiro vitimou cerca de 6 milhões de judeus, enquanto o segundo, de acordo com o Livro Negro do Comunismo, levou à morte de aproximadamente 100 milhões de cidadãos sujeitos ao jugo das ditaduras vermelhas. Por isso, tais crimes, verdadeiros motivos de opróbrio para a história da humanidade, não podem ser olvidados da consciência coletiva, até mesmo para garantir que atos que aviltam contra a própria natureza humana não sejam mais praticados, levando à peremptória criminalização dos ideais defendidos pelos nazistas e pelos comunistas. Nos casos retrotranscritos, o direito ao esquecimento não deve ser aplicado.
Portanto, o direito ao esquecimento é um importante componente dos Ordenamentos Jurídicos dos Estados Nacionais que defendem a democracia e os direitos fundamentais, permitindo o recato, a privacidade e a reinserção social de seus habitantes. Apesar das críticas e ressalvas quanto ao seu uso, que deve ser feito com circunspecção e ponderação de interesses ao se analisar os casos concretos, tal direito continua existindo protegido pelo supedâneo do Direito Constitucional hodierno: a dignidade da pessoa humana. Desse modo, pode-se, efetivamente, alcançar a e ordem e o progresso.