OS ESTADOS DESUNIDOS DE AMÉRICA: o paradoxo de uma democracia.

Publicado em 16 de outubro de 2020

Quantas críticas feitas antes, durante e após as eleições nos Estados, supostamente “Unidos” e, fundamental e substancialmente DESUNIDOS. Cada estado federado, tendo suas regras eleitorais, faz do “Ser americano” uma saga de “homo sapiens” que se alimenta de monstros de ódio, intolerância religiosa, discriminação racial e desigualdades sociais em fase de transição para o “homo demens” cuja loucura está na força de armas, na prepotência e arrogância de seus dirigentes inconformados com a derrota derradeira. A desaprovação do “Trumpismo” que culminou na eleição do Joe Biden revelou ao mundo as feridas de uma sociedade americana assentada nas injustiças sociais, no racismo estruturado, recreativo e na exaltação da supremacia branca. Tais ingredientes juntos trouxeram à tona a crueldade de uma sociedade marcada pela implacável brutalidade de seus dirigentes incarnados pela força policial que, ao longo da história, mal conseguiu esconder seu racismo estruturado e as injustiças do Poder Judiciário parcial e cego de seus eufemismos para absorver os policiais infratores e criminosos. É assim que ocorreu com o caso do George Floyd e outros de triste memória.

Há de salientar, contudo, que o horror vivido com a execução sumária de negros e negras naquela sociedade esconde também o horror econômico do capitalismo existente e vigente, incapaz de resolver tanto as questões raciais como as laborais.

As eleições americanas marcadas pelas acusações sem provas do Trumpismo contra a eleição de Biden tornaram-se o iceberg de bipolarização de comunidades das quais emergem a impostura e desconstrução da imagem de “Estados Unidos”, estando, na realidade e na sua essência, do ponto de vista ontológica “DESUNIDOS”.

Daí a indagação existencial diante da força bruta que gera a brutalidade da forca e, consequentemente, a decomposição do tecido social dos “Estados Unidos” para se tornarem “Desunidos”, nas vinganças, nas torturas física e mental, nas violações graves dos direitos humanos e, sobretudo, dos direitos das minorias, não no sentido da quantidade, mas da vulnerabilidade dos negros (as), dos latino-americanos e outros migrantes. Que sociedade essa em que, mesmo o navio afundando com o comandante derrotado a bordo, continua manobrando sob a proteção de um ambiente familiar republicano alimentado pela enxurrada de “Fake News”?

Lado outro, desponta-se, à sombra da Estátua da Liberdade, o prenúncio de mudanças observadas como o movimento incandescente “Black Lives Matter – BLM-” (Vidas Negras importam, tradução livre) e a força de direitos das minorias diante do direito da força. Não é pouca coisa se fizermos o translado dessa luta para as realidades vigentes no Brasil na véspera do Dia da Consciência Negra (20 de novembro) para que a violência policial e a impunidade que a caracterizam nesse país, deem lugar a atitudes concretas suscetíveis de provocar mudanças radicais e profundas contra o racismo estruturado e recreativo, a violência doméstica e a discriminação por raça, sexo, opção sexual, gênero, nacionalidade, línguas, grupos étnicos (sociais) e opiniões públicas.

Por quanto tempo as minorias vão continuar ser enganadas, esmagadas, massacradas na sua dignidade de pessoa humana? É tempo de mudança, é tempo de acabar com a ferocidade de indiferença dos injustos com suas exações e desvios de conduta mais perversos, funestos e sórdidos, pois, os ventos de liberdade vindos da eleição de Joe Biden, fruto da luta de BLM, acenderam uma luz de esperança numa sociedade brasileira também dividida pela patologia endêmica e histórica de violação dos direitos das minorias. Isso é apenas o começo de uma revolução em evolução.

 

Prof. Dr. Sébastien Kiwonghi Bizawu

Pós-doutorado em Democracia e Direitos Humanos pelo Ius Gentium Conimbrigae da Universidade de Coimbra, Portugal. Doutor e Mestre em Direito Internacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Pró-Reitor do Programa de Pós-Graduação em Direito da Dom Helder – Escola de Direito e Professor da Faculdade de Direito Conselheiro Lafaiete – MG.

 

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