Publicado em 20 de março de 2017
Tags: Direito para Todos, Produção de Textos
Letícia Souza Santos / let.santos@hotmail.com.br
Recentemente o judiciário brasileiro se deparou com uma decisão que colocou em debate os limites da atuação da magistratura no país. O juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, proibiu advogados de gravarem vídeos de audiências sem sua autorização, o que foi motivo de grandes discussões e questionamento sobre a eventual arbitrariedade do ato.
Tal debate se deu por que audiências se encontram entre os atos processuais que são públicos na forma da lei, salvo quando se exigir o segredo de justiça, conforme preleciona o Art. 368 do Código de Processo Civil: “Art. 368: A audiência será pública, ressalvada as exceções legais”.
Apesar de tal dispositivo ser suficiente para evidenciar um abuso de autoridade no caso narrado, mais especificadamente o Art. 367 em seus §5º e §6º, do Código de Processo Civil afasta qualquer sombra de dúvidas sobre a legalidade das gravações:
“Art. 367, CPC/15. O servidor lavrará, sob ditado do juiz, termo que conterá, em resumo, o ocorrido na audiência, bem como, por extenso, os despachos, as decisões e a sentença, se proferida no ato.(…)
É dever legal do juiz assegurar às partes igualdade de tratamento, bem como prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça. Desta forma, a OAB do Paraná semanifestou, definindo como “grave irregularidade” a proibição de gravações, feita pelo Juiz Federal, que não tem previsão no nosso ordenamento jurídico.
Audiências são tomadas a termo, ou seja, são registradas por escrito, oficializando-se o que foi dito de forma documentada, e podem ser gravadas para se evitar que posteriormente, os interessados, aleguem fatos que possam tornar o ato nulo. Trata-se de uma forma de resguardar o direito das partes para a efetividade e duração razoável do processo, sem embaraços ou controvérsias.
A inobservância dos procedimentos citados fere diretamente os princípios do contraditório e da ampla defesa, que são assegurados na Constituição de 1988 e visam zelar e garantir a defesa do acusado de forma pessoal, podendo o próprio acusado exercê-la, e técnica, quando realizada por advogado devidamente constituído, oportunizando esclarecimentos e respostas, respeitando a publicidade de todos atos processuais.
A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, inciso LX dispõe que: “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.
É natural que se constituam como atos processuais sigilosos, principalmente aqueles de cunho afetivo familiar, como casamento, separação de corpos, união estável, filiação, alimentos, interesse de menores, assim como aqueles que exijam o interesse público e social.
Outro procedimento que tem previsão legal de sigilo é o inquérito policial, para que não ocorra divulgação de informações que possam vir prejudicar a investigação criminal, sendo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.
O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil define que o advogado tem dever de guardar sigilo dos seus clientes, podendo responder a sanções disciplinares da Ordem, e tendo sua responsabilidade Civil e Penal. As gravações são direito do procurador e cabe a ele o zelo e sigilo necessários diante do processo.
Quando se trata de sigilo processual deve ser analisada sua relevância para o desenvolvimento do processo, de forma a garantir seguridade às partes e efetivação dos atos, não se pode colocar provas e testemunhas em risco quando a descrição se torna necessária ao resultado positivo do processo.
A Justiça é cega para que possa amparar de forma imparcial aos que dela precisam, normas constitucionais não podem ser suprimidas e ignoradas por quem tem o dever de aplicá-las.