PRESUNÇÃO DE MÁ-FÉ

Publicado em 11 de janeiro de 2021

“A paz, se possível, mas a verdade, a qualquer preço”, já dizia o monge agostiniano, e professor de teologia, Martinho Lutero. Embora tal afirmativa faça sentido na filosofia, o mesmo não se pode dizer quanto ao Direito. Embora a busca pela verdade seja intensa nos processos judiciais, há momentos em que a lei impõe limitações à atividade probatória. Não se admite, à guisa de exemplo, a extração da confissão mediante tortura. Dessa forma, ao contrário do que propõe Lutero, no direito processual busca-se a verdade, mas não a qualquer preço.

Tome-se como exemplo um caso originário do sul de Minas, iniciado na Comarca de Bom Sucesso. Trata-se de ação na qual o autor pretendia a anulação de um contrato de compra e venda, alegando a existência de um vício chamado “fraude contra credores”. Para que tal pedido fosse julgado procedente, e o referido negócio fosse anulado, era preciso demonstrar no processo a ocorrência de alguns requisitos, dentre os quais, a má-fé do vendedor e da compradora.

Ou seja, era preciso que o autor comprovasse que vendedor e compradora se uniram, em conluio fraudulento, com a intenção de lhe gerarem prejuízo através da celebração do referido contrato.

Enquanto o juiz de 1ª instância entendeu que não havia nos autos provas cabais de que as partes agiram de má-fé ao celebrarem o contrato de compra e venda, os desembargadores do TJMG, analisando exatamente os mesmos autos, tiveram posicionamento absolutamente diferente.

Os principais indícios usados pelo TJMG para reformar a sentença foram: a) o vendedor do imóvel era irmão da compradora; b) poucos meses antes da compra e venda, o vendedor do imóvel havia simulado um divórcio para passar seu patrimônio para sua “ex”-esposa.

Merece censura a decisão de primeira instância e aplausos a decisão de segunda instância. Tal desfecho foi bastante justo, pois ao mesmo tempo protegeu o terceiro de boa-fé e puniu o devedor malandro, acostumado a usar sua família para obter vantagens indevidas às custas dos outros.

Renato Armanelli Gibson
Advogado e professor de Processo Civil da Faculdade de Direito de Conselheiro Lafaiete. E-mail: gibson.renato@gmail.com

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